ICMS no E-Commerce: vitória parcial contra a burocracia
Liminar do STF derruba parte da nova regra do ICMS partilhado, que exige um processo burocrático inviável.
Antes de mais nada, não pretendo criticar a partilha de ICMS e sim a sua aplicação burocrática pelo CONFAZ.
A partilha é objeto da Emenda Constitucional 87/2015 que veio dividir gradativamente o ICMS gerado em compras interestaduais, principalmente no e-Commerce. Se você estava no PI e comprava um produto de uma loja virtual estabelecida em SP, o ICMS ficava para o estado de origem (SP). Agora, origem e destino irão dividir o imposto.
Como poderia ser feita a partilha?
O comerciante continuaria emitindo NF no estado de origem, como sempre fez. Inclusive pelo Simples, caso seja optante. E daí uma destas formas de partilhar seria usada:
- Um estado repassaria os impostos para o outro, num processo informatizado (custeado pelos estados, obviamente).
- Ou ainda, a arrecadação seria federalizada e depois haveria repasse aos estados (uma de câmara de compensação nacional).
Como os burrocratas (com 2 Rs mesmo) do CONFAZ deliberaram?
O CONFAZ é o Conselho Nacional de Política Fazendária, composto pelo Governo Federal (fazenda) e as secretarias de fazenda estaduais.
Quando se fala em governo, vemos sempre que o objetivo não é a aplicação correta das leis na cobrança do imposto, nem ajudar o país a sair da crise. É arrecadar mais e mais, para um poder público historicamente marcado por má gestão e corrupção, para tapar buracos de irresponsabilidade dos governantes. E jogar a conta para a sociedade (como a burocracia para as empresas), até mesmo prejudicando a própria arrecadação de impostos, que é afinal, a razão de existir o CONFAZ.
Deveriam fazer a aplicação certa da partilha, como citado acima, seria deixar o próprio Estado arcar com o custo dos processos burocráticos mas não, eles jogaram no colo das empresas.
A regra criada pelo CONFAZ para atender à Emenda Constitucional 87/2015, chamada Convênio ICMS 93/2015, criou um monstro burocrático, dificultando e inviabilizando o setor.
Antes da nova regra, bastava gerar a nota fiscal eletrônica e enviar uma via junto ao produto, a cada pedido.
A nova regra online exige do comerciante, a partir de 01/01/16:
– Verificar a alíquota de ICMS do seu estado e estado do cliente e calcular manualmente a diferença de alíquota interna e interestadual entre elas. Dividir esta diferença em duas partes, conforme a norma (divisão gradual), uma para cada estado (origem e destino).
– Emitir uma guia separada no estado de destino, pagar a guia, imprimir e grampear (!) na nota – e isso em plena era da Internet. E só então pode enviar o produto. Isso para cada pedido. O consumidor paga mais caro e fica esperando.
Para piorar:
– Precisa antes se cadastrar em todos os estados brasileiros (são 27 UFs) em que clientes venham a comprar. Cada um com seu sistema e suas regras.
– Cada pagamento e emissão de guia é manual, feito em sistema de cada estado, de formas diferentes.
– Cada estado tem suas alíquotas, o comerciante precisará nivelar por cima o preço para incluir o imposto mais alto provável.
Resultado:
– O grande varejista online contrata mais gente, só para cuidar desta burocracia extra (funcionários ou empresas terceiras) e obviamente repassa o custo para o consumidor. E nivela o preço por cima, como já dito.
– O pequeno varejista, optante do Simples (justamente para pagar todos os impostos numa só guia) fecha as portas. Não é exagero, desde Janeiro várias empresas desativaram seus sites.
– Ou optam por vender só no seu estado, ou para alguns estados. Temos agora um isolamento do cidadão de alguns estados e exclusão social por conta deste absurdo.
– Consumidor com menos opções de compras (fornecedores para seu estado) e preços mais altos, compram menos ou deixam de comprar.
– E o maior transportador de mercadorias do e-Commerce brasileiro – Correios (empresa do governo), deixa de entregar e faturar também.
– Com menos venda e empresas fechadas, temos desemprego e não temos ICMS para os famintos governos estaduais.
Logo, em plena crise, o CONFAZ dá um tiro no pé, provocando fechamento de empresas, queda nas vendas e perda de arrecadação de ICMS.
Todos perdem.
Uma vitória parcial no STF
O Sebrae, com apoio de várias associações empresariais (que já haviam avaliado o impacto negativo da norma), solicitou à OAB que entrasse com uma Adin, Ação Direta de Inconstitucionalidade, no Supremo Tribunal Federal, contra Convênio ICMS 93/2015, em sua cláusula 9, por ter incluído as micro e pequenas empresas, optantes do Simples, o que seria inconstitucional. O que a OAB fez em 29/01/16.
Uma liminar concedida pelo STF em 17/02/16, pelo ministro Dias Toffoli, derruba a cláusula 9 do citado convênio – o que libera os pequenos desta burocracia.
Polêmica ainda não acabou
Pequenas empresas comemoram. Fica a dúvida se a liminar dará segurança jurídica permanente sobre este caso. Melhor seria o CONFAZ rever sua norma.
Mas, ainda falta que as associações empresariais consigam reverter a norma toda e que o poder público seja obrigado a fazer a partilha via repasse entre estados (ou câmara nacional de compensação) e não gerando custo burocrático para as lojas.
E o melhor mesmo seria unificar o ICMS nacionalmente, com as mesmas regras, processos e alíquotas. Isso simplificaria de verdade a tributação, facilitaria a partilha, acabaria com a guerra fiscal e os estados arrecadariam até mais – pelo volume, pois menor custo burocrático e menor preço representa mais venda e mais tributo.
Setor do e-Commerce deveria ser incentivado
E para encerrar, o e-Commerce tem contribuído com o Brasil para superar a crise. Num ano difícil como 2015, o e-bit registrou aumento nas vendas em 15,3% (na comparação com 2014), representando R$ 41,3 bilhões de faturamento (conforme divulgação da Camara-e.net).
Graças à Internet, pessoas dos mais variados cantos do país têm acesso (que não teriam fora dela) a um grande leque de produtos, vários deles com preços atraentes, escolhidos e entregues na comodidade de seus lares.
A norma (convênio) criticada serve justamente para excluir muitas pessoas de comprar online, fechar empresas e encarecer produtos, prejudicando a própria arrecadação de ICMS.
Ao invés de estrangular o setor com burocracia, o governo deveria ser parceiro, ouvir as associações e incentivar as vendas online, para com isso, gerar mais negócios e arrecadar mais.
Por Charles A. Müller
Profissional de Marketing e MBA em e-Commerce.
Veja também: o autor escreve sobre Marketing, Comunicação e E-Commerce em www.sitecharles.com
Links sobre este tema:
http://camara-e.net/2016/02/17/stf-concede-liminar-derrubando-clausula-do-confaz-que-obriga-pmes-do-simples-a-seguir-as-regras-de-compartilhamento-do-icms
http://exame.abril.com.br/pme/noticias/contra-burocracia-sebrae-quer-mudar-regras-do-icms
https://goo.gl/o4GZrk (este link é de um vídeo, com o depoimento de um lojista que resolveu encerrar sua operação de vendas online em 12/01/16).
e-Commerce: https://www.sitecharles.com/assunto/e-commerce/
Muito bom Charles!
Frederico Marcel Paiva
Gerente de contas na TAG Interativa
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